sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Reminiscências.

Sempre que ando de transportes, sento-me à janela. Escolho um lugar que me permita observar o que se passa fora da lata amarela onde me movo, ou que me deixe absorver os ténues raios de sol que Janeiro me dá. Hoje revivi todos os meus amores, começando no primeiro, terminando no que ainda está por cicatrizar.
Nunca procurei namorados, foram sempre eles que me encontraram. Habituei-me a ser a miúda alta, que dava nas vistas pelo riso borbulhante e por não se preocupar muito com o que os outros pensam. Não procurava namorados porque ambicionava o Amor que o cinema e os livros me incutiam. E os namorados encontravam-me, nem sei bem como. O meu primeiro amor tinha olhos rasgados e o nariz pontuado de sardas. Não dizia os l's e tinha um nome cheio deles, o que me enternecia de tal maneira que acreditei ser amor. Eu já era um bicho raro nessa altura, de pescoço esguio e pernilonga, e quando nos olhávamos nos olhos, havia uma discrepância de centímetros que tornava tudo mais engraçado. Perguntavam-me se não me importava e respondia sempre que não. Afinal ele era meu namorado e trazia na pele um cheiro adocicado a alfazema e sabão que me fazia sorrir. Dava-me a mão com força e protegia-me do frio, quando namorávamos no jardim. Tinha uma mota mas nunca lhe dei esse voto de confiança, de o abraçar pelas costas e deixar-me à porta de casa, com o barulho de motor de fundo e um beijo fugido. Foi a primeira cicatriz que me lembro de ter deixado em alguém, a falta de confiança naquele amor, regado a ímpetos adolescentes e inocentes. O nosso primeiro beijo aconteceu nas traseiras de um bar, no muro do court de tênis. Ainda me lembro do pullover azul que trazia, uma das abas da camisa de fora, outra para dentro. Fazia frio e pegou-me na mão. Olhei-o dando uma gargalhada das minhas, que acabei por calar perante um olhar rasgado e traquino. Sentou-se mais perto e embriaguei-me de alfazema, pela primeira vez. E hoje, que tudo isto aflorou, trago o cheiro comigo como se tivesse sido ontem o primeiro beijo.

1 comentário:

Richter disse...

que história bonita :)

O primeiro rapaz de quem gostei, "a sério" também não dizia os l's :p xD