terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Da (louca) sempre tua.

Os ciclos, como tudo na vida, têm um fim. Como gavetas que se fecham, também há janelas que teimam em não se abrir de par em par e chaves que amordaçam a tranca da porta. Há quem viva finais saudosistas, melancólicos. Finais que deixam marcas difíceis de sarar e de aceitar, que nem o beijo do tempo apaga. Para isso existem os bálsamos e o viver torna-se suportável. Estupidamente suportável quando deveria ser insustentável pela grandiosidade e magnificência do milagre da Vida. A dor cola-nos as pálpebras e não há raio de sol que penetre num coração enegrecido da fuligem da pancadaria, resultado de demasiada exposição. Num tamborilar de dedos inquietos o mesmo coração, que um dia se deixou agredir, revela-se rejuvenescido. Combalido, é certo, mas de forças renovadas por uma crença inabalável num milagre tão grande como o da Vida: o do Amor.

O Amor contou-me em surdina que ainda não é hora de abrir a porta a estranhos. Vê como ainda deambulam sonhos passados em largos mantos negros de lutos vigentes. Sussurei-lhe que nestas coisas de doer não há tempos cronometrados; cada cicatriz é única e deve ser tratada com respeito e dedicação. Um ponto mal dado e lá se vai o bordado todo. Repensei a vida incerta deste coração e bastaram-me três momentos para lhe compreender a lentidão dos tempos. Tu, outrora voz quente do Amor, levaste-me a acreditar em promessas de desejos cumpridos, numa inocência infantil. Não infantilóide; infantil, de ingenuidade crente. O problema é que amadureci e quis mais (sou uma insatisfeita por natureza). Chegou então o segundo momento. Embrenhei-me nas tuas filosofias, reconheci-me nas tuas catarses, perdi-me em cada composição melódica de permissas inacabadas. E no meu Amor tu eras perfeito sempre que crescias, de peito feito. Debaixo da tua asa protectora convencia-me que eras tu, só tu. Eventualmente chegámos ao corpo e à alma. Ao cerne essencial da questão matemática deste jogo a três tempos, porque o coração gritava dores exasperantes de união. No palco do teu corpo encenei o meu jogo de sedução e nas tuas mãos descobri-me mulher. À boca de cena agradeceste-me com beijos doces, de um desejo que mantinhas latente, por Amor. Chorei quando te vi descer do cavalo branco e seguir caminho a pé, sem olhar para trás. Pouco tiveste de príncipe nesse momento, confesso-te. Prostrei-me em oração, na certeza que sentirias a minha falta, num compasso de espera patético, enquanto o coração se desfazia em cacos e o som da solidão ecoava na mansão dos mortos em que se tornará a minha vida. Esperei por ti, de olhos postos na ténue linha do horizonte, lembrança do teu maxilar rachado na meninice. Perdi contas aos dias e deixei de traçar linhas na parede a cada anoitecer.

E, subitamente, lembrei-me. Como um formigueiro remoto num qualquer canto da alma, despertei de sorriso preguiçoso num viver feliz. Tudo o que me é inato despertou e voltei a dançar em pontas, assobiando fórmulas mágicas às pedras da calçada portuguesa. O coração, ainda em estágio nestas coisas da felicidade pura, alertou-me - é mais fácil partir um pé que já quebrara em tempos. Mas eu prossegui na dança porque, afinal de contas meu Amor, resumi-nos a três momentos. E a perfeição do viver engloba sete.

4 comentários:

mariana disse...

até me arrepio :D

disse...

ohh *.*

estás em que ano e onde ana?'$

Anónimo disse...

Dança. Que o Amor não se faz em 3 actos. E tu sabes muito Dele.

Laura Ferreira disse...

Ufa... Esta doeu.