sexta-feira, 5 de outubro de 2007


Andava pela rua, naquele calor morno de uma tarde de Inverno que o sol decidira beijar. Andava por andar, olhando as ruas, as pessoas, as pedras da calçada. Levava um livro debaixo do braço que já sabia de cor. A capa gasta deixava adivinhar as inúmeras vezes que lhe pegara. Foi sentar-se numa praceta sem nome, aos pés de uma estátua que lhe pareceu ser alguém histórico e importante, pela pose em que o colocaram. Sorriu ao pensar nisto. "Será que não somos todos tão importantes a ponto de merecer uma estátua?", conversou com os seus botões. Depois percebeu que todos temos direito a uma homenagem. Não necessariamente uma homenagem esculpida e de grandes proporções. Vivermos a nossa vida já é homenageá-la, torná-la importante, e se a vivermos com graça bastará para merecermos o amor do mundo.

Voltou a sorrir. Por vezes achava-se louca por pensar nestas coisas, por achar que mais ninguém perdia tempo com estes pensamentos triviais. Outras vezes achava-se especial por isso. Era feliz, tão simplesmente isso. Não precisava de muito para o ser e era-o, sem medos. Houve alturas em que fugira da felicidade, achando-a um mal maior. Houve alturas em que pensou em ser miserável para sempre, em nunca sair do fundo do poço, vendo o sol lá em baixo. Uma grande bola de luz que a impedia de ver com clareza enchendo-lhe os olhos de brilhos. E a vida provou-lhe que estava errada. Todos temos segundas oportunidades. E terceiras e quartas. Era por isso que sorria. Por saber que cada erro era uma lição aprendida e cada queda a tornava mais forte, mesmo que isso implicasse parecer fraca aos olhos de todos. Levantou-se, sacudiu o pó das calças e caminhou, mais uma vez. Sem rumo e levando a história com ela. Nunca ninguém soube o que aquele livro contava, especulando se seria um diário, episódios de uma vida vivida ou simplesmente uma obra de ficção. Quando lhe perguntavam sorria, dizendo "Faz-me bem. Trazê-lo dá-me segurança e cada página sou eu. Quando me esqueço de quem sou não me olho ao espelho; abro-o ao acaso e sei que me vou encontrar."
Olhou uma última vez para trás, para a estátua. Aproximou-se e segredou-lhe: "Fica aí homem de pedra. O mundo não é como o do teu tempo e provavelmente não saberias sorrir e cantar canções de embalar."

1 comentário:

Monica disse...

Acho que andas a abusar da minha sensibilidade, acho que sim! :P

Mas é verdade..todos nós deviamos ser homenageados pelo que somos, com estátua ou sem ela, merecemos a homenagem da nossa vida. Não sei se isto te serve de homenagem mas há-de passar muito tempo, cresceremos, seremos maiores por dentro e esperemos que melhores e esta tua maneira de ser e de escrever o mundo, vai ficar sempre na minha memória. Tenho a certeza disso porque é tão perto de mim e tão bom, que é impossivel esquecer.
E tenho dito. =)

beijinho***